Deixaram o Senhor, Deus de seus pais, que os tirara da terra do Egito,e foram-se após outros deuses, dentre os deuses das gentes que havia ao redor deles, e os adoraram, e provocaram o Senhor à ira. Porquanto deixaram o Senhor e serviram a Baal e Astarote.” Jz 2:12,13
Esse texto é escrito em Juizes logo após a morte de Josué. Com a morte de Josué, acaba o ciclo de Moisés e a peregrinação. Os filhos de Israel já estão assentados na terra prometida, e já não são tantas as batalhas como na época de Josué ainda vivo. Porém naquela terra prometida havia um povo com seus próprios costumes, ritos e deuses; os cananeus. Esse povo foi disperso na ocupação de Israel, porém não foi totalmente dizimada. E esse restante foi o suficiente para que os filhos de Israel se contaminassem com sua cultura, mitos e imundícies. Sim, o povo eleito por Deus se deixou levar por crenças em deuses pagãos e se esqueceram do Deus que os tirara do Egito. Os versículos acima sintetizam bem como se inicia o ciclo dos juízes em Israel; a adoração a Baal, o esquecimento de Deus. Você já parou para pensar no porquê de Israel ter sofrido tal queda? Porque Deus sempre se refere a se prostituir? O que os seduziu a adorar outros deuses? Moda? Necessidade? Estupidez mesmo?
Nessa série de posts você vai saber mais sobre Baal, o deus que seduziu o povo escolhido.
E começaremos a falar sobre os cananeus. Até por volta de 2.200 a.C. eles eram um povo só, os filhos de Cã, filho de Noé, situados na região a beira mar e às margens do rio Jordão, praticamente onde hoje é Israel. Após essa data, houve uma migração do povo amorreu e hiteu para aquela região; misturando a cultura, religião e o modo de vida desses povos. Esse povo multi racial continuou a ser chamado de cananeu mesmo com toda a mistura.
Essa mistura étnica resultou na fusão de diversas religiões. Antes da migração do povo amorreu, segundo a mitologia cananéia, existia um deus supremo, EL (ou Dagon), que era o deus acima de todos os outros deuses. O povo amorreu trás consigo um novo deus, Hadade – deus do trovão, raio e fertilidade, que começa, segundo a mitologia, a se sobressair a EL. Isso é um sintoma típico da assimilação de religiões, no qual o deus local (EL cananeu) vai sendo substituído por um outro deus (Hadade amorreu).
O deus Hadade é o Baal que conhecemos, tão citado na Bíblia.Esse é o quadro religioso que os filhos de Israel encontram no início da conquista de Canaã, por volta de 1.406 a.C. De um lado Canaã que é uma nação que relaciona os deuses e os cultos ao tempo e às plantações. E, do outro lado, o povo de Israel que apesar de toda demonstração do poder de Yahweh, se contamina com todo esse panteão de deuses cananeus, principalmente Baal, ou Hadade.
Para os cananeus, até a migração do povo amorreu e hiteu para as terras de Canaã, EL era o nome do deus supremo, sobre todos os outros deuses. Isso deve ao fato dos cananeus descenderem diretamente de Noé através de seu filho Cã. Provavelmente após a maldição de Cã (Gn 9:25), ele se apartou levando consigo a cultura de seus pais, que adoravam a EL como Deus único e verdadeiro. A diferença é que os cananeus criaram diversos outros deuses para si, mas sempre respeitando EL como deus supremo em seu panteão de deuses.
Com a chegada dos amorreus, a mistura de raças e religiões trouxe diversos novos deuses. Dois deles citaremos em especial: Dagon e Hadade. Dagon (imagem ao lado) era o deus principal dos amorreus, esposo de Astarote (aquela que anda sobre as águas), pais de Hadade (Baal). Os amorreus imaginavam Dagon na forma de um peixe, deus da fecundação humana e da criação.
Devido a mistura de religiões entre cananeus e amorreus o EL cananeu foi assimilado ao Dagon amorreu, se tornando um só deus. Ficou o nome cananeu (EL) e a história de Dagon. Assim, o EL cananeu já nada tinha a ver com o EL de Israel. O EL cananeu era o pai de Baal e de outros deuses. Os filisteus, que viriam a ocupar aquela região tempos mais tarde, preferiam usar o nome Dagon, como visto em I Samuel 5:2-7.
Essa assimilação de religiões e deuses era muito comum naquela época. O EL cananeu também é associado ao deus Cronus grego (imagem ao lado). A história de Cronus e EL cananeu (Dagon) tem detalhes em comum: eram tiranos e foram derrotados pelo próprio filho que tomou sua posição de deus supremo. No caso de Cronus, foi derrotado por Zeus. No caso de EL cananeu (Dagon), foi derrotado por Baal. Notem quem tanto Zeus quanto Baal são deuses do trovão. Isso também é devido à assimilação de deuses.
Essa assimilação acontece porque os povos foram criados através da peregrinação. O mesmo povo foi se dispersando e levando consigo as mesmas histórias e crenças que, com o tempo, foram tomando suas próprias formas, mas nunca perdendo suas características em comum. Por isso, a palavra EL que primeiramente veio de Israel, depois foi se assimilando com outras culturas e tomando outros significados. Isso acontece também com a palavra Elohim (que significa deuses, mas no caso de Yahweh tem plural majestático).
Dessa forma podemos entender um pouco mais sobre a relação entre o Deus de Israel, o deus cananeu, o deus amorreu e até mesmo entre deuses gregos. E também podemos entender o porque da ira do Senhor contra os outros deuses, pois o povo utilizava o Seu Nome, ou um de seus nomes, em vão (Êxodo 20:7). Ou seja, para nomear outros deuses.
Vamos contar um pouco de historinha para entender melhor a novela mexicana que é a mitologia cananéia. EL era o pai de todos os deuses e tinha uma esposa, Astarote. Dentre todos os filhos ele nomeia Yammu (deus do mar) para ficar em seu lugar. Baal, como queria o trono, fica furioso e derrota Yammu. Outros dois irmãos de Yammu, vendo essa situação, se voltam contra Baal; eram eles Naharu (deus dos rios) e Motu (a morte). Baal é derrotado por Motu e enviado para as profundezas.
É aí que entra a irmã e amante de Baal, Anat, que o traz de volta da morte. Baal volta, manda Motu pra as profundezas e aniquila o próprio pai, EL, tomando assim não só o seu trono, como também a sua esposa, Astarote. Assim, EL cai no esquecimento e Baal se torna o deus principal da mitologia cananéia. Gostaram da historinha?
Pois bem, toda essa história foi criada pelos cananeus apenas para explicar porque o deus local deles (EL) foi substituído por Hadade, deus dos amorreus, que passou a ser chamado de Baal em Canaã (ver parte 2). Por Canaã ser totalmente dependente da chuva para suas plantações, foi muito conveniente tomar para si o deus da chuva do povo amorreu. Sim, Baal era deus da chuva, do trovão e da fertilidade do solo. Nada mais conveniente para um povo que vivia da agricultura. Para os cananeus, a chuva era o sêmen de Baal caindo sobre a terra, tornando-a fértil, como um homem torna fértil uma mulher com o seu sêmen.
Para os cananeus, Baal era o senhor do tempo; ele fazia chover, trovejar ou fazer sol. Ele era adorado principalmente nos montes, ou lugares altos. Mas podia também ser adorado em qualquer lugar que tivesse um Astarote (um pedaço de tronco fincado na terra, igual a um tótem). Isso porque a esposa de Baal, Astarote, era simbolizada por qualquer tipo de pedaço de árvore ou planta. Convém lembrar que Jezabel, a terrível perseguidora de profetas e esposa do também terrível rei Acabe, era adoradora de Astarote.
Com a idéia do sêmen de Baal caindo sobre a terra em forma de chuva, os cultos a Baal centravam-se na atividade sexual. A religião cananéia era grosseiramente sexual e perversa porque requeria no culto o serviço de homens e mulheres prostitutos disponíveis como sacerdotes; a pessoa para adorar a Baal tinha que copular com um ou vários desses sacerdotes. Isso é visto no livro de Oséias. A sua esposa não era simplesmente uma prostitua, era uma sacerdotisa de Baal (para um estudo completo sobre Oséias clique aqui).
Essa era a mitologia cananéia que os hebreus encontraram ao sair do Egito. E foi com essa mitologia absurda que eles se contaminaram. No próximo capítulo, vamos falar um pouco sobre a corrupção de Israel diante de Baal. De quem foi a culpa? Por que se contaminaram?